sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A que será que se destina?

Sentia o chão queimar a solidão do sertanejo solitário, que na busca de terra boa, caminha ao sol escaldante do sertão nordestino.
O que passava pela mente deste cabra com espingarda e facão, discípulos da morte certa, ele que ouvia dizer do amor que há entre Deus e o Diabo. Simplesmente caminhar era seu destino, era a dor e a própria companhia do eu calado que era. Não lhe dizia nada, pois nada lhe dizia também, a vida muda do cangaceiro de chapéu quebrado, as botas velhas sujas de poeira, cheiro de suor e lagrimas secas, a areia transando com a terra, a caatinga toda ali, em sua exuberância.
Água corria debaixo da terra, e na terra corria o olhar sem esperança da conformidade daquilo tudo.
Nada lhe era dado, tudo lhe era roubado, nada lhe era dito, tudo lhe era descrito com horror e espanto de quem nada sabia.
Mas arre que vida é esta que me destinaste? Que há de ser esse destino cruel meu santo Deus? Eu rezo a São Jorge meu santinho protetor, que arre de vida é esta? Empreste-me sua lança santinho, para que eu possa do sangue fazer justiça, para que da lança o homem crie vergonha, vergonha de grito, vergonha de morte, vergonha de fome, há tanta fome e tanta sede que se mistura, que já nem sei mais o que me aflige, nem sei meu Deus, nem sei.
Tanta a minha ignorância que não posso dizer o que me dói, pois parece que tudo me dói.
É o destino ou será a vida mesmo, porque a de existir tudo isso e não o nada, o nada não a de ser melhor que isto?
Essa terra pobre, rachada e seca, essa gente com fome e calada que vive nas redes a se balançar, bebendo a água dos céus que demoram a cair, a lama toda na água, a água e lama na transa do sertão, eu propriamente sertanejo, eu de sertão e sangue, de viola e inchada, de dor e morte, vida e sexo de todos os elementos, que a de me curar dessa dor que germina em pleno sol, como a de germinar tal coisa tão negra, esses arbustos todos?
Tudo quieto, tudo cego. A prosa do trovador soa em cânticos negros, a se eu pudesse nessa trova de Deus e Diabo, impedir tal crueldade, eu fazia chover nessa terra rachada, nessa velhice terrestre toda antiga mais esquecida. Mas grito baixo, e mesmo se gritasse alto, não me escutariam. Não me escutam. Não escutam nada. Nada é ouvido. Silêncio de morte. Silêncio... Silêncio. Impotência. Quanto silêncio. Grite! eu quero gritos pavorosos, ande, levante-se homem, crie vergonha cabra dos infernos, ande! grite mais, não deixe os homens dormir, acorde todos, ande! se lhe sobrar fôlego cuspa, isso mesmo cuspa o chão seco, cuspa no concreto nos arranha-céus, cuspa na janela e não pare de gritar, há de ver no mundo que nos ouça gritar!
- Bruno Bueno Requena

Um comentário:

  1. Lembrei-me de ''Vidas Secas'' e ''Morte e Vida Severina''ao ler o que escreveste...
    Caracoles, como tu usas palavras intensas Bruno.
    Alguém é carregado de emoções aqui ;)
    Gostei do que escreveste.

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